9 de nov. de 2012

Diário de Bordo #9

postado por Caleb Henrique


Olá, Viajantes.
Estou morrendo de saudades de vocês, sério.
Demorei uma eternidade para fazer uma nova postagem porque a semana de trabalho foi corrida e eu queria concluir a leitura de Contos de Meigan, que por sinal É INCRÍVEL! Então, em breve tem resenha por aqui. Uma toda especial, por sinal, se o submarino colaborar e enviar minha câmera que está viajando há quase 30 dias. Sério, acho que a enviaram dos Estados Unidos, afinal, já recebi livros importados bem mais rapidamente. Enfim, deixemos minha revolta de lado e vamos a mais um texto de minha autoria (dos quais vocês obviamente já estão fartos).


PERFECT STRANGERS


Aproximou-se do balcão e com uma voz ébria e vacilante pediu uma dose do uísque mais forte que a casa possuísse. Era o terceiro bar daquela noite.
─ Vou querer o mesmo que o rapazote ─ disse um homem de idade avançada que também acabara de chegar e sentar por ali. ─ Com limão e gelo, por gentileza. — Virou-se para o rapaz e perguntou — Por que está bebendo meu camarada? Comemoração certamente não é, pois você não estaria sozinho. Tão moço assim, certamente está sofrendo por mulher. Estou certo?
Por um momento sentiu raiva daquele velho intrometido e quis mandar-lhe procurar outro cara para encher o saco, mas conteve-se. Parecia ser um bom sujeito afinal. Sua cabeça doía como o diabo e antes que se desse conta estava perguntando — É tão óbvio assim que eu sou um fodido azarado?
— Ora vamos, meu amigo. Não fique aí proferindo tolices. O que ela tinha de tão especial, afinal? — perguntou com um ar compreensivo de quem já teve essa mesma conversa centenas de outras vezes.
— Era possuidora do dom de me deixar em paz ou de me tirar toda ela. Levava-me aos extremos, na verdade; E me fazia bem, mais do que qualquer outra poderá vir a fazer algum dia. Sinceramente, se um dia me perguntassem 'Qual o traço que melhor a define?' eu responderia sem hesitar 'Ah, a bipolaridade, meu caro. É confusa feito o diabo e é isso que a torna perfeita. Eu me apaixonei por milhares dela. Cada dia uma diferente. Consegue imaginar? Se apaixonar todos os dias por uma garota diferente e descobrir que mesmo com as mudanças ela continua a mesma?’.
— É uma garota rara... — disse com um brilho familiar nos olhos — O moço vai me desculpando a pergunta, mas não posso evita-la: Se ela é tudo isso para você, por que não estão mais juntos?
Abriu a boca para responder, mas foi interrompido pelo barman, que silenciosamente entregava as doses de uísques aos seus respectivos donos. Tomou metade da sua em um único gole e teve certeza de que nunca iria se acostumar com aquele ardor na garganta. Pigarreou e disse finalmente num tom irritadiço ― Ora, meu velho, não é obvio? No fim ela é igual a todas as outras pessoas do mundo, ficou o quanto aguentou, mas inevitavelmente partiu; ou o senhor por acaso não sabe que é sempre assim? Todo mundo vai embora um dia.
As palavras pareceram atingir o homem como um soco e se o álcool já não tivesse consumido a maior parte de seus pensamentos teria se desculpado imediatamente, mas tudo que fez foi fitá-lo com um ar de incompreensão. Que tinha aquele homem afinal? Porque tanto interesse em sua desilusão? A raiva era crescente dentro de si.
― Não seja tolo ― disse o homem ― A vida é muito mais complexa do que o que você acha que sabe. Nem tudo o que vai volta, é verdade. Mas o destino está traçado, meu caro. Acredite em mim, eu sei do que estou falando. Você a ama? Levante a bunda desse banco, vá para a casa, tome uma ducha e durma. Espere a ressaca passar e vá à luta. Mas antes que cometa qualquer equívoco, alerto: Não seja insistente e não tente obrigá-la a voltar. Deixe-a livre, mas a deixe saber que você não desistiu de vocês. Se ela tiver de voltar, o fará por livre e espontânea vontade.
O conselho parecia sensato, mas toda angústia que havia em seu âmago se transformou em fúria e antes que percebesse estava gritando. ― E quem o senhor acha que é, afinal, para se meter nos meus problemas? Você não passa de um velho fodido que vem afogar suas mágoas e frustrações numa droga de bar ― estava acontecendo de novo, pela terceira vez naquela mesma noite. Sabia que seria expulso.
O velho caminhou até ele e ao invés de falar mal ou agredi-lo, sussurrou: ― Eu sou você, meu jovem. O destino está traçado, eu já lhe disse. Vá para casa e siga meu conselho. Se as coisas tiverem de dar certo, elas darão. Deixe a vida seguir seu próprio rumo e não sucumba mais ao álcool. Se tiver de sofrer, sofra. Posso afirmar que você voltará a sorrir alguma hora. ― E dizendo isso, virou-se e caminhou até a saída.
Ainda aturdido o jovem fitou o pulso do velho homem em busca de uma constatação. Estava lá. A mesma tatuagem que um dia optou fazer, um pouco mais desbotada, mas lá, palavra por palavra. “Until the very end”. Ele conseguiria lê-las mesmo num nível máximo de embriaguez, afinal, elas eram parte dele... Até o fim.

Caleb Henrique


Assim me despeço, com a promessa de voltar.
E como há braços, abraços.