Escrever com a Larissa é sempre maravilhoso, espero que gostem desse tanto quanto gostei de escrever!
SOBRE SAUDADE
Queria
escrever isso com uma máquina de escrever, como um manuscrito antigo e charmoso
enviado numa carta ao seu apartamento, mas não tenho a máquina e agora não
tenho mais seu endereço. Então escrevo aqui mesmo.
Estava
lembrando do dia em que nos conhecemos. Engraçado como isso aconteceu, era um
dia de chuva aqui onde eu moro, nas primeiras palavras notei que você era bom
com as mesmas, nunca sorria claramente. Diferente e ao mesmo tempo igual, igual
a si mesmo numa diferença que só quem realmente sabe entender, enxerga. Cá
entre nós, eu sinto essa necessidade de te imortalizar, já pensou nessa
loucura? Sinto necessidade, em retribuição a toda a felicidade que você me fez
sentir. Quando pessoas desconhecidas lerem meus escritos, vão saber que existiu
alguém que foi alvo de tanto amor. Você espalhou fotos suas sorrindo e fazendo
caretas pelo meu celular. Espalhou o seu cheiro pelo meu casaco. Espalhou as
suas digitais pelos meus livros. Espalhou doçura nos meus dias, espalhou
felicidade em mim. Você sabe o que passou e eu sei o que passei. Às vezes, no
íntimo da minha coragem busco alguma força para te contar de quando achei que
tudo eram flores e ao chegar perto demais acabei vendo que elas tinham
espinhos. Vou te falar algo que nunca falei: você é como entrar numa
roda-gigante e morrer de medo de que ela pare bem lá em cima, mas ao mesmo
tempo torcer para nunca sair de lá. Você é esse antagonismo de sensações, que
sempre torna tudo tão novo. E como eu poderia não reparar? Como eu poderia não
admitir que você deixou meu sorriso mais solto?
Em
algumas vezes estou divagando com minhas memórias, revivendo alguns dias,
repassando algumas dores. E por isso que olhar tuas fotos me fazem bem. Teu
sorriso me ensinou que ser feliz é uma distração, é não perceber quando as
coisas mudam de direção. Estou criando coragem pra te contar da minha falta de
capacidade em ser feliz. Você iria rir da minha cara e dizer que não existe
nada de coisas mudando de direção. Minha luta agora é acreditar que as coisas
ficarão boas, e isso nunca foi tão difícil de confiar. Eu sei que tudo ficou
confuso, mas as palavras que rodam em minha mente se tornaram um labirinto, e
cá estou eu tateando pela saída.
Só
quero dizer que hoje fui na loja onde vende teu perfume. Eu já tava esquecendo teu
cheiro, e me desesperei ao perceber que esses pequenos detalhes iam se perder
na minha memória. Sou egoísta quando se trata de você e agora eu me recuso
perceber que as pequenas coisas ao teu lado já não podem ser vividas. Peguei
uma amostra do teu perfume e comprei mais uns dias de lembranças. Que o cheiro
não se vá e que a lembrança fique.
Com
amor e sempre sua,
C.
*
* *
Confesso
que passei minutos inteiros estático em frente a essa tela — incrédulo. Ainda
parece irreal ter e-mail seu depois de tudo que a vida aprontou. Hesitei e
tentei forçar-me a acreditar que não passava de um spam ou mesmo um daqueles
e-mails coletivos enviado pelo descuido de um clique, muito embora o assunto
especificasse: Sobre saudade. Mas pensar em você me mandando largar
mão de ser bobo me levou a uma vez mais deliciar-me com tua escrita que tanto
amo. Lembro bem da primeira vez que te vi. Estava aí de passagem e chovia quando
você entrou na cafeteria e se aproximou do balcão. A cada detalhe percebido eu ficava mais hipnotizado. Fosse o modo como você
distraidamente brincava com um dos cachos de seu cabelo enquanto esperava ou
sua singela exigência de preferir o seu café numa xícara ao invés dos já
tradicionais copos ecológicos. É bem verdade que você me encantou e me vi
obrigado a ir em sua direção e puxar um assunto qualquer, só para descobrir sua
voz e o modo como sorri ou fica brava — esse último, aliás, tão encantador
quanto o primeiro. Engraçado pensar no quanto tudo aconteceu de forma natural e
em quão rápido você passou a ocupar a maior parte de meus pensamentos. Lembro do
seu riso solto, quase infantil, carregado de animação a cada nova ideia, cada
lugar que eu “precisava conhecer” e dos planos que fizemos juntos. Ainda dói
falar dos planos — provavelmente mais ainda em você que em mim. Dói lembrar da tua
expressão séria ao me contar, em nosso segundo encontro, da gravidez e da
decisão de criar a criança sozinha. Não titubeou ao afirmar não querer auxílio
ou reconhecimento do pai e aquela foi a primeira vez que vi uma chama de
coragem acesa na claridade de seus olhos. Sei que fui firme ao dizer que não
era um problema e que isso em nada diminuía o fascínio que você exercia sobre mim,
o que nunca deixou de ser verdade, mas não foi suficiente para mudar a
realidade: eu nada mais era que um jovem com a mala cheia de planos e sonhos
que pouco sabia sobre a dureza da vida. Sonhos e planos que, por ventura,
passaram a ser nossos.
Sonhei
tanto em estar aqui, mas nenhum sonho me alertou sobre a imensa dor da solidão ao embarcar naquele
avião ou ao abrir a porta do meu, que deveria ser nosso, apartamento. Mesmo a
visão da Big Eye London pela janela foi insuficiente na missão de me animar e
da Londres que tanto sonhei só o frio fez jus
a expectativa. De você, me restou apenas uma caixa cheia de polaroides e
palavras distribuídas em cartas, bilhetes e guardanapos; um envelope com uma
mecha de seu cabelo, aquela amostra do teu perfume que você me deu certa vez — etiquetado
com “em caso de saudade, abra o vidro”
— e a lembrança de nossa última conversa que terminou com você esbravejando e
repetidamente chamando-me de covarde. (Culpado).
Os
primeiros dias foram os piores e logo eu que sempre fora tão otimista, passei a
enxergar o mundo meio cinza. O curso começou e os professores eram ainda mais
incríveis do que eu imaginara, mas te imaginei em cada paisagem fotografada e todas
as minhas modelos foram você. O fato é que você sempre será minha musa
inspiradora e se hoje tenho algum reconhecimento por meu trabalho é a ti que
ele é devido. Sabe, você se encaixaria tão bem aqui que nem preciso fazer
esforço para te imaginar aqui agora mesmo, sentada naquela poltrona com um
livro entre as pernas e uma xícara na cabeceira enquanto o bebê dorme tranquilo
— o bebê sempre está presente e enche o apartamento de alegria.
Só
quero te dizer que em quesito de felicidade, você é sempre o primeiro
pensamento; e que nenhuma outra jamais foi capaz de te arrancar do meu peito. Sei
que é tarde para dizer isso, mas se você tivesse me gritado que eu deveria
lutar por você ao invés de que enquanto vida tivesse você nunca mais queria me
ver, eu teria lutado. Teria confrontado meu pai e ficado ao seu lado. Certa vez
li em algum lugar a seguinte frase: NO
ONE FORGETS A HURRICANE*. Eu concordo. Você foi o meu.
Com todo meu amor,
Seu L.
*NINGUÉM ESQUECE UM FURACÃO.
Caleb Henrique e Larissa Rebecca
Assim me despeço, com a promessa de voltar.
E como há braços, abraços.