23 de jan. de 2015

Diário de Bordo #24

postado por Caleb Henrique

Olá, Viajantes!
Escrever com a Larissa é sempre maravilhoso, espero que gostem desse tanto quanto gostei de escrever!


SOBRE SAUDADE



Queria escrever isso com uma máquina de escrever, como um manuscrito antigo e charmoso enviado numa carta ao seu apartamento, mas não tenho a máquina e agora não tenho mais seu endereço. Então escrevo aqui mesmo.

Estava lembrando do dia em que nos conhecemos. Engraçado como isso aconteceu, era um dia de chuva aqui onde eu moro, nas primeiras palavras notei que você era bom com as mesmas, nunca sorria claramente. Diferente e ao mesmo tempo igual, igual a si mesmo numa diferença que só quem realmente sabe entender, enxerga. Cá entre nós, eu sinto essa necessidade de te imortalizar, já pensou nessa loucura? Sinto necessidade, em retribuição a toda a felicidade que você me fez sentir. Quando pessoas desconhecidas lerem meus escritos, vão saber que existiu alguém que foi alvo de tanto amor. Você espalhou fotos suas sorrindo e fazendo caretas pelo meu celular. Espalhou o seu cheiro pelo meu casaco. Espalhou as suas digitais pelos meus livros. Espalhou doçura nos meus dias, espalhou felicidade em mim. Você sabe o que passou e eu sei o que passei. Às vezes, no íntimo da minha coragem busco alguma força para te contar de quando achei que tudo eram flores e ao chegar perto demais acabei vendo que elas tinham espinhos. Vou te falar algo que nunca falei: você é como entrar numa roda-gigante e morrer de medo de que ela pare bem lá em cima, mas ao mesmo tempo torcer para nunca sair de lá. Você é esse antagonismo de sensações, que sempre torna tudo tão novo. E como eu poderia não reparar? Como eu poderia não admitir que você deixou meu sorriso mais solto?

Em algumas vezes estou divagando com minhas memórias, revivendo alguns dias, repassando algumas dores. E por isso que olhar tuas fotos me fazem bem. Teu sorriso me ensinou que ser feliz é uma distração, é não perceber quando as coisas mudam de direção. Estou criando coragem pra te contar da minha falta de capacidade em ser feliz. Você iria rir da minha cara e dizer que não existe nada de coisas mudando de direção. Minha luta agora é acreditar que as coisas ficarão boas, e isso nunca foi tão difícil de confiar. Eu sei que tudo ficou confuso, mas as palavras que rodam em minha mente se tornaram um labirinto, e cá estou eu tateando pela saída.

Só quero dizer que hoje fui na loja onde vende teu perfume. Eu já tava esquecendo teu cheiro, e me desesperei ao perceber que esses pequenos detalhes iam se perder na minha memória. Sou egoísta quando se trata de você e agora eu me recuso perceber que as pequenas coisas ao teu lado já não podem ser vividas. Peguei uma amostra do teu perfume e comprei mais uns dias de lembranças. Que o cheiro não se vá e que a lembrança fique.

Com amor e sempre sua,
C.


* * *


Confesso que passei minutos inteiros estático em frente a essa tela — incrédulo. Ainda parece irreal ter e-mail seu depois de tudo que a vida aprontou. Hesitei e tentei forçar-me a acreditar que não passava de um spam ou mesmo um daqueles e-mails coletivos enviado pelo descuido de um clique, muito embora o assunto especificasse: Sobre saudade. Mas pensar em você me mandando largar mão de ser bobo me levou a uma vez mais deliciar-me com tua escrita que tanto amo. Lembro bem da primeira vez que te vi. Estava aí de passagem e chovia quando você entrou na cafeteria e se aproximou do balcão. A cada detalhe percebido eu ficava mais hipnotizado. Fosse o modo como você distraidamente brincava com um dos cachos de seu cabelo enquanto esperava ou sua singela exigência de preferir o seu café numa xícara ao invés dos já tradicionais copos ecológicos. É bem verdade que você me encantou e me vi obrigado a ir em sua direção e puxar um assunto qualquer, só para descobrir sua voz e o modo como sorri ou fica brava — esse último, aliás, tão encantador quanto o primeiro. Engraçado pensar no quanto tudo aconteceu de forma natural e em quão rápido você passou a ocupar a maior parte de meus pensamentos. Lembro do seu riso solto, quase infantil, carregado de animação a cada nova ideia, cada lugar que eu “precisava conhecer” e dos planos que fizemos juntos. Ainda dói falar dos planos — provavelmente mais ainda em você que em mim. Dói lembrar da tua expressão séria ao me contar, em nosso segundo encontro, da gravidez e da decisão de criar a criança sozinha. Não titubeou ao afirmar não querer auxílio ou reconhecimento do pai e aquela foi a primeira vez que vi uma chama de coragem acesa na claridade de seus olhos. Sei que fui firme ao dizer que não era um problema e que isso em nada diminuía o fascínio que você exercia sobre mim, o que nunca deixou de ser verdade, mas não foi suficiente para mudar a realidade: eu nada mais era que um jovem com a mala cheia de planos e sonhos que pouco sabia sobre a dureza da vida. Sonhos e planos que, por ventura, passaram a ser nossos.

Sonhei tanto em estar aqui, mas nenhum sonho me alertou sobre a imensa dor da solidão ao embarcar naquele avião ou ao abrir a porta do meu, que deveria ser nosso, apartamento. Mesmo a visão da Big Eye London pela janela foi insuficiente na missão de me animar e da Londres que tanto sonhei só o frio fez jus a expectativa. De você, me restou apenas uma caixa cheia de polaroides e palavras distribuídas em cartas, bilhetes e guardanapos; um envelope com uma mecha de seu cabelo, aquela amostra do teu perfume que você me deu certa vez — etiquetado com “em caso de saudade, abra o vidro” — e a lembrança de nossa última conversa que terminou com você esbravejando e repetidamente chamando-me de covarde. (Culpado).

Os primeiros dias foram os piores e logo eu que sempre fora tão otimista, passei a enxergar o mundo meio cinza. O curso começou e os professores eram ainda mais incríveis do que eu imaginara, mas te imaginei em cada paisagem fotografada e todas as minhas modelos foram você. O fato é que você sempre será minha musa inspiradora e se hoje tenho algum reconhecimento por meu trabalho é a ti que ele é devido. Sabe, você se encaixaria tão bem aqui que nem preciso fazer esforço para te imaginar aqui agora mesmo, sentada naquela poltrona com um livro entre as pernas e uma xícara na cabeceira enquanto o bebê dorme tranquilo — o bebê sempre está presente e enche o apartamento de alegria.

Só quero te dizer que em quesito de felicidade, você é sempre o primeiro pensamento; e que nenhuma outra jamais foi capaz de te arrancar do meu peito. Sei que é tarde para dizer isso, mas se você tivesse me gritado que eu deveria lutar por você ao invés de que enquanto vida tivesse você nunca mais queria me ver, eu teria lutado. Teria confrontado meu pai e ficado ao seu lado. Certa vez li em algum lugar a seguinte frase: NO ONE FORGETS A HURRICANE*. Eu concordo. Você foi o meu.

Com todo meu amor,
Seu L.

*NINGUÉM ESQUECE UM FURACÃO.

Caleb Henrique e Larissa Rebecca


Assim me despeço, com a promessa de voltar.
E como há braços, abraços.