23 de jan. de 2013

Diário de Bordo #12

postado por Caleb Henrique




Olá, Viajantes!
Como tem passado? Então, vou ser breve: O escrito de hoje é forte, talvez o mais forte que eu já tenha escrito, então, se não se sentir a vontade pode abandonar a leitura sem culpa e dizer que o fez nos comentários - opiniões sinceras são muito importantes, então... Vamos lá?

LETTER FROM HELL

Sabe quando as pessoas falam sobre ir para o inferno após cometer suicido? É a mais pura — e dolorosa — verdade. Descobri isso da pior forma possível... Fazendo.

Tinha pouco mais que 17 anos quando tomei a desesperada decisão de dar um fim em minha vida fodida. Um pai alcoólatra e uma mãe desapegada que saía quase todas as noites e me deixava só com meus dois irmãos mais velhos. Quando menor, eu os chamava de Super Gêmeos, já que acometi aos dois a figura paterna e o exemplo a seguir. Eles cuidaram de mim a vida toda, mas pouco depois de completarem 18 anos mudaram para um apartamento na capital e começaram a trabalhar meio-expediente para manter as despesas e a faculdade. Insisti para ir junto, o que já era a ideia inicial deles, mas fui estritamente proibido pelos meus pais, que não aceitaram a ideia. Pensei em fugir, mas tinha medo demais para fazer algo tão impensado, então, comecei a me isolar em minha própria solidão. Tentava calar o máximo que pudesse diante das reclamações e brigas constantes no ambiente familiar. Por diversas vezes vi meus pais aos tapas e inocentemente fui vítima de violência. Eu costumava dizer que vivia no inferno. Quanta ingenuidade. Se eu ao menos pudesse prever nessa época. Juro, retribuiria cada tapa com um abraço e um obrigado. Se soubesse que as lágrimas não cessariam. Tampouco a dor. Dor. Dor e mais dor. Muita dor. Eu teria feito diferente. Mas agora é tarde para me arrepender. Tarde demais. 

Meus irmãos vinham me visitar algumas vezes. No princípio vinham uma vez por semana. Depois começaram a fazer visitas quinzenais e, raramente, mensais. Mas às vezes — após muita insistência — conseguiam me levar junto para passar alguns finais de semana com eles. São os melhores finais de semana dos quais tenho lembranças. Nenhuma briga ou gritaria. Nenhum tapa ou ameaça. Acordar às 10h em uma manhã de sábado era o ápice do prazer para mim, que sempre fui obrigado a estar de pé às 5h30m em qualquer dia da semana. Eles, inclusive, tinham conseguido convencer meus “captores” a me deixar passar um mês inteiro com eles. Nas próximas férias. Eu só teria de esperar mais dois meses. Queria ter esperado. Mas eu não tenho mais o direito de querer, esperar, pensar, agir ou sequer lembrar de que um dia eu fui um ser humano. Então, nem se pergunte como estou escrevendo essa carta. Estou arriscando mais do que você imagina... Não quero nem saber o que me acontecerá caso eu seja descoberto. Sequer me permito imaginar. 

Faltavam exatos dezessete dias para as férias quando eu desisti. Meu pai havia chegado bêbado mais uma vez em casa. Ele e minha mãe começaram a discutir. O som de tapas e objetos sendo atirados era crescente. Na mesma proporção que os gritos. “Por que você não fez o meu jantar, sua puta?” / “Se você fosse homem o suficiente para trabalhar e colocar comida dentro de casa, o jantar estaria pronto.” / “O filho da puta do Júnior não comeu nada ou você é tão cadela que nem sequer preparou comida para aquele merdinha que nós chamamos de filho? Falando nisso. Onde está aquele filho da puta?” e então eu sabia que seria espancado. Que levaria socos e pontapés até implorar por clemência ou desmaiar — o que sempre acontecia primeiro. Sabia que ninguém poderia — ou tentaria — me ajudar. Diferentemente das outras vezes, fui tomado por um sentimento de ira crescente e antes que meu pai pudesse me alcançar eu já havia saído e batido a porta bruscamente, ignorando os gritos subsequentes. Corri o máximo que pude. Com a adrenalina pulsando em minhas veias e busquei abrigo num grande e antigo prédio abandonado. Subi a longa escadaria ainda correndo e quando percebi já estava no terraço. Caminhei até o parapeito e olhei para baixo. De início a visão me causou vertigem, mas logo consegui olhar atentamente as pessoas indo e vindo lá embaixo. Nenhuma delas me viu. Pareciam formiguinhas daquela altura. Então fui tomado pelos pensamentos. Ele vai te matar quando você voltar, você sabe disso. Vá em frente e pule. Não vai doer e você ainda descobrirá a sensação de voar. O que você tem a perder, afinal? Eu não tinha medo de morrer, mas o último pensamento foi um soco no meu estômago. O que eu tinha a perder? Todos de quem eu já gostei nessa vida — que, por sinal, eu podia contar nos dedos — estavam longe. Então, sem raciocinar fiz o que ele pedia. Pulei. Queria dizer que a sensação de voar é incrível e talvez fosse se eu não tivesse me arrependido na hora que o fiz. Foi tudo muito rápido e o chão parecia mais e mais próximo a cada instante. Quis gritar, fechar os olhos e fazer qualquer coisa que me impedisse de cair, mas eu sabia que era uma batalha perdida. Talvez eu tivesse sorte e enfartasse antes de encostar o chão como aconteceu tantas vezes em alguns casos semelhantes. Isso não aconteceu. Não demorou quase nada até eu esborrachar a cara no chão, mas é a aí que vem a pior parte. A queda não parou. Estava caindo num abismo e tudo que eu lembro é que era escuro e que um medo crescente invadia meu peito a cada instante, como uma mão que aperta forte e sente prazer em ver a dor alheia. Caí pelo que me pareceu uma eternidade, até cheguei a implorar em pensamentos para que aquilo acabasse logo. Hoje, eu daria tudo para nunca parar de cair, pois mesmo com a dor e o medo crescentes, aqueles foram meus últimos momentos de paz. Eu caí diretamente para o inferno. Eu não desejo que vocês conheçam esse lugar. Tampouco tenho palavras para descrever tudo o que já vi e passei aqui, então me resumo em dizer que tudo o que você pensa sobre ele, por mais terrível que seja, nunca chegará a ser sequer um terço tão desesperador e horripilante quanto à realidade. Aos que pensam que a dor cessará ao dar um “basta!”, afirmo, os seus infernos particulares seriam paraísos para miDROGA! Acho que tem alguém vindo. Este é meu último contato com o mundo de vocês então espero que minha mensagem sirva para algu


Caleb Henrique


Peço, por fim, sua opinião sincera nos comentários (ela é muito importante para mim).
Assim me despeço, com a promessa de voltar.
E como há braços, abraços.